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Foto do escritorJosé Lurker

Existe remédio para dependência química?

Atualizado: 20 de mai.

Todo adicto sonha com a ideia de uma pílula mágica que cure seu problema. E provavelmente sua família - e a sociedade - também. Na verdade, isso não ocorre só com a adicção, mas com qualquer doença crônica. A fantasia de um remédio que cure a moléstia é uma concepção muito prevalente e extensivamente explorada. Os alquimistas já buscavam a Panaceia Universal, um elixir que curava todos os males. E a mercantilização desta fantasia, frequentemente por charlatães, com ou sem inscrição em conselhos profissionais, é uma dura realidade, particularmente em um mundo onde as redes sociais se tornaram uma das grandes fontes de informação - e onde você pode encontrar a pior - e a melhor informação. Bem, a adicção (e aqui também estamos falando de alcoolismo) é uma doença crônica, e que portanto não tem cura. A boa notícia é que é uma doença tratável.


Os remédios

O tratamento de uma doença multifacetada como a adicção precisa ser multidimensional. Existem aspectos físicos, emocionais, sociais e espirituais que devem ser contemplados em qualquer abordagem terapêutica. Neste post vamos focar no tratamento farmacológico, ou seja, no uso de remédios. Falaremos de uma maneira genérica, já que não é o objetivo o aprofundamento em medicamentos específicos. A primeira questão é que as adicções são muito associadas à doenças psiquiátricas, funcionando como um fator desencadeador do problema, ou como sua consequência. Um exemplo é a maconha, que na adolescência pode deixar a pessoa mais vulnerável ao surgimento de quadros psicóticos , entre eles a esquizofrenia. Depressão, ansiedade, transtornos obsessivo-compulsivos, e os transtornos do espectro bipolar ("bipolaridade") tem uma prevalência muito alta entre adictos. E estes distúrbios psiquiátricos devem ser abordados, pois seu tratamento é essencial na construção da Recuperação. Um fato importante é que um período relativamente largo de abstinência deve ocorrer para que um diagnóstico psiquiátrico seja firmado. Alguns dizem que antes de 3 meses de total abstinência não se pode fazer um diagnóstico, pois até então os estados psíquicos podem ser decorrentes da própria intoxicação crônica por uma - ou várias - substâncias. Então, este tema dos medicamentos usados nas comorbidades deve ser um trabalho do adicto junto com o psiquiatra que o acompanha. Nunca é demais ressaltar que os medicamentos devem ser usados conforme a prescrição do médico, e não devem ser suspensos ou ter suas doses aumentadas, sem o seu conhecimento e anuência.

Afinal, e os remédios?

Em relação ao abuso de álcool, existem os chamados medicamentos aversivos - o principal deles é o Dissulfiram (Antietanol®) , e ele é chamado aversivo porque, se a pessoa beber, passa muito mal, com palpitações, náuseas, vermelhidão no rosto, queda da pressão, etc. Este era um medicamento barato e foi utilizado por décadas. Houve sua descontinuação pelo laboratório Sanofi , sugerindo que "haveriam alternativas terapêuticas no mercado". Uma excelente droga, mas perigosa, se usada sem o conhecimento do alcoólico, e por outro lado, caso a pessoa decidisse beber, era só parar o remédio. O outro medicamento usado no tratamento do alcoolismo é a Naltrexona (Revia®, Uninaltrex®), cuja ação é diminuir a fissura - ou a vontade premente de beber - e também reduzir a sensação agradável associada ao consumo do álcool. O Acamprosato (Campral®) é uma terceira droga, cuja principal ação é reduzir sintomas da síndrome de abstinência alcoólica. Pouco usado, atualmente não é encontrado nas farmácias no Brasil.

Na dependência de opióides - hoje uma verdadeira pandemia nos EUA , representados pela morfina, fentanil, codeína, heroína e outros, a principal alternativa terapêutica é a Metadona. Trata-se de um medicamento cuja utilização requer conhecimento e experiência de quem prescreve. Deve ser usado sob estrita supervisão médica. A Metadona também é um analgésico potente, sendo usada para dor crônica, em geral por médicos especialistas no tratamento da dor.

E a cocaína...

Infelizmente não existem alternativas medicamentosas para tratar a dependência à cocaína. Existem estudos pesquisando uma vacina, que poderia servir de coadjuvante no tratamento da dependência de crack e cocaína. É uma esperança para milhões de adictos que procuram se recuperar da dependência de cocaína. Um de meus psiquiatras, uma autoridade na Medicina da Adicção, com décadas de experiência no tratamento de adictos, me afirmou que ele acreditava ser a cocaína a droga mais dependógena que existe.

Mas meu cigarrinho não quero parar.

O tabagismo é o maior fator de risco modificável para inúmeras doenças. Câncer, uma enorme gama de doenças pulmonares, urinárias e circulatórias, enfim, parar de fumar é sempre uma atitude saudável. Em um programa de recuperação, onde a mudança de hábitos de vida é fundamental, a cessação do hábito de fumar é um tijolinho a mais deste castelo. Boa parte das clínicas especializadas em dependência química, particularmente dentro de uma perspectiva psiquiátrica, tem uma política de Fumo Zero e oferecem tratamentos para amenizar a fissura e a abstinência. O Tabagismo tem várias possibilidades terapêuticas, desde terapias de reposição de nicotina (adesivos transdérmicos como o Niquitin® ou gomas de mascar como Nicorette®), uso de antidepressivos como a Nortriptilina e a Bupropiona, o anti-hipertensivo Clonidina. A Vareniciclina (Champix®) é também uma alternativa, porém é mais cara e tem um esquema de tomada mais complexo.

Ah, a pessoa que continua fumando parece ter um risco maior de recair. E Bill W faleceu em decorrência de uma pneumonia, como complicação de um enfisema resultante de décadas de tabagismo.


Creio que

abordamos o tratamento farmacológico das adicções de uma maneira geral. Os links oferecidos no post podem ampliar a compreensão deste assunto tão relevante. Duas coisas: existe uma irmandade de Doze Passos para o enfrentamento do Tabagismo: são os Nicotine Anonymous. E a segunda coisa, mais importante, é que o tratamento medicamentoso das adicções é só uma das diversas dimensões de sua abordagem. Hábitos de vida saudáveis, cultivo da espiritualidade, acompanhamento psicológico e/ou psiquiátrico, frequência à reuniões de irmandades de Doze Passos - e todas as sugestões do programa, como o trabalho dos passos, a escolha de um padrinho, a crença em um Poder Superior da sua concepção - todos estes elementos devem ser nutridos, um dia de cada vez, para uma Recuperacão sólida e consistente.



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