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Foto do escritorJosé Lurker

Memória curta

Atualizado: 20 de mai.


O adicto tem memória curta. Basta estar um pouco melhor para começar a esquecer tudo o que passou - e o sofrimento que causou. A memória do adicto é traiçoeira: ela simplesmente apaga o mal-estar, o desconforto, a absoluta impotência e ele começa a fantasiar sobre o quanto era bom estar sob influência da droga 💉. Não é exatamente ser bom, é diferente. No fundo a neuroquímica da adicção é o que prepondera. O que quero dizer com isso? É que não é exatamente a memória do prazer, alguma coisa se passa no cérebro do dependente químico que apaga as vivências sombrias e o deixa numa situação de enorme vulnerabilidade. Porque a ideia de usar passa de um patamar racional, onde a medida da consequência de seus atos ainda faz diferença, para um nível de total irracionalidade, onde pensamentos pouco realistas e intrusivos passam a fustigá-lo sem pausa. Uma ruminação, uma ambivalência torturante. A memória, neste momento, é o caos. Entende-se porque existem situações em que somente uma internação é capaz de impedir uma recaída.

Um arremedo de liberdade

A liberdade tolhida externamente. Arranjos familiares podem ajudar, como impedir a saída do adicto da sua casa impedindo-o de ter acesso às chaves 🔑 da casa. Vivo uma situação semelhante no momento. E a impossibilidade de sair de casa 🏠 já me livrou a cara mais de uma vez. Pois, depois de me deparar com um gatilho - pessoas, lugares e comportamentos - se tivesse a possibilidade de sair, já estava longe. Se chega a dar um desconforto ser trancado 🔒 dentro de casa? Claro que dá. Mas sei que isso é para o meu bem, eu mesmo construí estes acordos e combinações com minha família. E é uma ilusão de liberdade 🗽.

Caminhos tortuosos

Os caminhos tortuosos da memória de um adicto são cheios de becos sem saída, de túneis escuros, de pensamento equivocados. Escondem a realidade da adicção: "éramos impotentes perante nossa adicção e nossas se tornaram ingovernáveis". A memória ruim, deficiente - pelo menos no que tange às drogas, leva ao engano mais previsível em um adicto: que ele vai conseguir controlar desta vez , que vai usar por pouco tempo e que ninguém vai perceber. Esse pensamento é perseguido insamente, a negação de tudo o que já passou

Perdeu, playboy. Hora de rever seus conceitos e buscar a memória verdadeira, aquela que se constrói com afetos, estórias, viagens, que se encontra na literatura, nas artes e na cultura.


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